“Inflação Nutella”: por que sentimos que tudo está mais caro, mesmo quando o índice oficial não sobe tanto?

“Inflação Nutella”: por que sentimos que tudo está mais caro, mesmo quando o índice oficial não sobe tanto?
A inflação desacelera. Mas o seu bolso não sente. — Imagem/Canva

Você vai ao mercado comprar as mesmas coisas de sempre.
Sai com metade do que costumava levar.
Olha para o carrinho, depois para a nota fiscal, e pensa: “não é possível”.
Mas aí abre o jornal e vê a manchete:
“Inflação oficial desacelera.”

Como assim?
Se a inflação está “sob controle”, por que a gente sente que está tudo mais caro?

A resposta pode estar naquilo que os economistas chamam de percepção inflacionária. Ou, como alguns brincam nas redes: “Inflação Nutella”.
Não é o índice que engana — é o que ele escolhe medir.

O que é o IPCA (e o que ele deixa de fora)

O IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) é o índice oficial que mede a inflação no Brasil.
Ele acompanha o preço de uma cesta de produtos e serviços consumidos por famílias com renda de 1 a 40 salários mínimos, em diversas capitais do país.

Parece abrangente, né? Mas aqui está o detalhe importante:
Essa cesta é uma média.
E você não é a média.

Se os produtos que mais subiram são justamente os que você consome com frequência (leite, arroz, plano de saúde, aluguel, gasolina), o seu bolso vai sentir muito mais — mesmo que o índice geral diga que está tudo “sob controle”.

Por que “Nutella”?

O meme da “inflação Nutella” surgiu porque muitos produtos que fazem parte do dia a dia da classe média urbana (como café premium, azeite, chocolate, apps, streamings, delivery e tecnologia) não têm tanto peso na cesta do IPCA.

Ou seja: quando essas coisas sobem, o índice pouco se move — mas a percepção de que o custo de vida aumentou dispara.

E convenhamos: a gente não sente inflação com números.
A gente sente no carrinho, no aluguel, no almoço fora, no que desaparece da conta mesmo sem compra grande.

Por que percebemos mais a alta do que a queda?

Existe também um fator psicológico.
O ser humano é naturalmente mais sensível a perdas do que a ganhos.
Se o arroz subiu R$ 2, isso incomoda mais do que a queda de R$ 1 no feijão.

E tem mais: notamos muito mais o que consumimos com frequência.
Se o preço do tomate caiu, mas você quase não compra tomate, isso não faz diferença.
Agora, se o café da manhã ficou mais caro — isso afeta todo dia.

É a chamada inflação sentida: não é só o que sobe, é o que te impacta diretamente.

Nova economia, nova inflação

Outro ponto pouco falado: os padrões de consumo mudaram — mas os índices nem sempre acompanharam.

Hoje, a gente gasta com:

  • Assinaturas digitais

  • Apps de transporte

  • Planos de dados

  • Delivery

  • Produtos gourmetizados

  • Serviços personalizados

Tudo isso pesa no orçamento, mas nem sempre pesa nos índices tradicionais.
Ou seja: a inflação oficial pode estar em 4%, mas sua inflação pessoal pode estar bem mais próxima de 10%, 12%… ou até mais.

E o aluguel? E o plano de saúde?

Alguns dos vilões mais fortes da inflação real são serviços que crescem de forma silenciosa, mas constante.
Aluguel, condomínio, seguro, educação, saúde.

Esses itens não sobem de um mês pro outro. Mas, quando o reajuste vem, ele fica com você o ano inteiro.
E diferente de um chocolate que você pode evitar, esses gastos são fixos. Inescapáveis.

Por isso, a sensação de sufoco continua — mesmo que o índice se mantenha estável.

Então a inflação está mentindo?

Não. O IPCA é técnico, baseado em metodologia reconhecida e necessário para decisões econômicas e políticas.
Mas ele não traduz a experiência de cada pessoa.
Ele é um termômetro da média, não um retrato da sua realidade.

O problema começa quando essa média é usada como verdade absoluta, e quando não enxergamos os efeitos reais nos diferentes grupos da população

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